Vídeos em família e óculos de realidade virtual transformam forma de vender imóvel de luxo

em Valor Econômico, 1º/junho

Corretoras usam tecnologia para aproximar compradores.

O mercado de imóveis de alto padrão tem se tornado mais competitivo, na medida em que incorporadoras veem no segmento uma forma de fugir do poder de compra mais apertado da classe média e de conseguir margens melhores.

No primeiro trimestre, o número de unidades de luxo lançadas no país cresceu 57% e as vendas subiram 35% — bem acima do crescimento geral dos imóveis novos, que tiveram alta de 8% nos lançamentos e de 21% nas vendas, de acordo com a consultoria Brain.

Para conseguir atrair o cliente nesse meio, duas corretoras com foco antagônico adotam estratégia parecida: aproximar o comprador do imóvel e deles mesmos.

Com uma equipe de oito pessoas, a corretora Tamara Stief faz das redes sociais o principal canal de venda para os “antiguinhos”, os apartamentos usados de alto padrão que ela negocia. Com Fábio Silveira, seu marido e sócio, atrás da câmera, faz vídeos conversando e apresentando o imóvel, como se a acompanhassem em uma visita.

É tudo sem roteiro, diz Silveira, mas não sem planejamento — egresso do mercado de venda de software, ele critica o amadorismo que vê entre corretores, função que ainda carregaria um peso de “subemprego”, na sua visão.

Apelidados de “maramores”, os 308 mil seguidores do perfil de Tamara no Instagram a viram ficar grávida pela segunda vez e apresentar imóveis junto com o bebê. A relação de proximidade ajuda a criar confiança. “Não nos apresentamos como uma imobiliária, mas como uma pessoa”, diz Silveira. “A pessoa se sente amiga da Tamara”.

A corretora se especializou em imóveis antigos após trabalhar por quase cinco anos em uma incorporadora de alto padrão e presenciar uma queda na qualidade dos projetos deois da chegada de um fundo de investimento, que cobrava margens e volumes maiores.

Ela se tornou crítica do trabalho que grandes incorporadoras estão fazendo na cidade. “Quero que a cidade se desenvolva, mas sou contra fazer um prédio de 40 andares em rua pequena e não entregar infraestrutura”, afirma. Critica, também, a falta de cuidado com arquitetura. “Fico pensando no que vou deixar para o meu bebê, uma cidade sem alma, sem vida”.

O casal não vê motivos para a disparidade de preços entre imóveis novos e usados — os lançamentos podem custar até cinco vezes mais do que um antigo da mesma região, destacam. Para eles, os prédios antigos têm construção melhor, janelas grandes, mais luz natural, paredes grossas e estão bem localizados nos bairros mais disputados. Segundo a Brain, o preço médio do metro quadrado de imóveis novos de luxo em São Paulo, onde Stief mais atua, era de R$ 19,5 mil no primeiro trimestre

Nos vídeos, ela tenta passar a sensação de como será viver naquele imóvel e indica as possibilidades de reforma.

Um dos apelos dos imóveis novos, e especialmente no segmento de alto padrão, é oferecer uma variedade de áreas comuns, que ultrapassam o trio piscina, academia e salão de festa. Já é recorrente ver prédios com spa, estúdio de pilates e quadra de tênis, entre outros ambientes.

Isso, no discurso das incorporadoras, compensa uma redução da metragem dos cômodos e das unidades — principalmente na camada “inicial” do alto padrão.

Para o casal, não há vantagem, já que é dentro da casa que os moradores realmente vivem. Uma estratégia de Stief é, inclusive, destacar o valor do imóvel por metro quadrado e a vantagem dos espaços grandes.

Do lado dos imóveis novos, a corretora Barts&Co utiliza as áreas comuns como um dos apelos para vender lançamentos de alto padrão na cidade.

A corretora cria visitas virtuais aos lançamentos, para serem acessadas por meio de óculos de realidade virtual, que pode ser levado pelo corretor até o cliente. Com ele, o comprador potencial pode “caminhar” pelo projeto e conhecer os espaços, algo que só era possível de ser feito nos imóveis antigos e nos apartamentos decorados dos lançamentos.

Caminhar por uma área comum, por exemplo, é novidade. “Como vou mostrar todo o valor agregado de ter um espaço ‘wellness’ no 35º andar?”, questiona Alessandro Bartelle, fundador do negócio. Com o óculos, a experiência fica mais próxima da realidade.

A ideia da Barts é conseguir vender sem ter que levar o cliente até o estande. Assim, pode mostrar vários projetos, de várias empresas e cidades, no mesmo encontro.

Bartelle é da família controladora da calçadista Vulcabras, que também tem participação na incorporadora Even. A Barts fechou parceria com a Even e outras cinco incorporadoras de grande porte.

A corretora, que começou a operar há um ano, não tem planos de expandir para os imóveis usados. Para Bartelle, a experiência que oferece não seria tão “disruptiva”. A expansão deve vir pela venda de peças de arte — que podem ser inseridas no tour virtual.

Sua companhia tem a meta de comercializar de R$ 800 milhões a R$ 1 bilhão em lançamentos até o fim de 2026, dos quais a corretora fica com 4% a 6%.

Já Stief afirma ter capacidade de vender até R$ 40 milhões por mês, embora esteja na faixa dos R$ 26 milhões atualmente — a corretora também fica com 6% desse total.


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